Por ocasião do Dia da Proteção dos Dados, que se comemora no dia 28 de janeiro de 2023, partilhamos testemunhos que salientam a importância desta data.


Vera Lúcia Raposo

NOVA School of Law

As preocupações mais óbvias suscitadas pelo Dia Internacional da Protecção de Dados prendem-se com a protecção dos direitos à privacidade e à protecção de dados, na perspectiva de que o tratamento de dados se pode revelar um risco para a pessoa. Atrevo-me, porém, a invocar aqui uma outra preocupação, esta de sentido oposto: a imperiosa necessidade de utilizar (e reutilizar) dados para a realização de direitos fundamentais.

Alguns exemplos: o tratamento de doenças exige medicamentos e dispositivos médicos cada vez mais sofisticados, para os quais o tratamento de dados genéticos e de saúde é essencial; a melhoria da qualidade de vida reclama o desenvolvimento de sistemas de IA, a ser utilizados na medicina, mas também na justiça, na administração, na educação, entre outros, sendo que este objectivo não é possível sem o tratamento de dados; a delineação de políticas públicas promotoras de bem-estar e desenvolvimento social funda-se no tratamento de dados.

Restrições excessivas ao tratamento de dados revelam-se tão perniciosas como a ausência de qualquer restrição.


Vinicius Mozetic

Universidade do Oeste de Santa Catarina

Neste dia 28 de janeiro de 2023 comemora-se o Dia Internacional da Proteção de Dados, data que reforça a importância da proteção de direitos fundamentais de liberdade e privacidade relacionados ao uso de dados pessoais. O cumprimento das regras de proteção de dados impõe desafios às instituições do setor público e privado e levanta algumas questões: O tratamento de dados pessoais, por processos automatizados, é uma atividade de risco? A possibilidade de controle unificado da atividade da pessoa, nas múltiplas situações de vida, permite o conhecimento de sua conduta pública e privada? É possível identificar os princípios mais evidentes de uma predisposição de consideração da proteção de dados pessoais como direito fundamental?

Precisamos provocar uma reflexão sobre a importância da proteção de dados pessoais como um direito fundamental. Portanto, é necessária a instituição de mecanismos que possibilitem às pessoas deter conhecimento e controle sobre seus dados – que, no fundo, são expressão direta de sua personalidade. Por este motivo, a proteção de dados pessoais é considerada em diversos ordenamentos jurídicos como um instrumento essencial para a proteção da pessoa humana e como um direito fundamental.


Hugo Leite

Encarregado de Proteção de Dados da Fidelidade

Ao celebrar este dia da Privacidade e da Proteção de Dados, destaco, ao longo dos últimos anos, uma maior maturidade ao nível da recolha de dados com qualidade e exatidão, bem como uma maior adesão à implementação da proteção de dados desde a conceção e por defeito nos projetos de transformação digital.

O RGPD está cada vez mais acompanhado de iniciativas legislativas em áreas estratégicas, como cibersegurança, governação europeia de dados e inteligência artificial. Encarando o futuro com otimismo, o maior desafio será este: para que o RGPD se assuma como o pilar do mercado único digital e da “economia dos dados”, será determinante resolver as inconsistências na transposição destas normas para a realidade prática, uma melhor clareza e coordenação entre as diferentes Autoridades e, nas organizações, a criação de uma estrutura sólida de governação assente em princípios éticos e segurança.


Isabel Fernandes

Diretora dos Serviços Jurídicos do Grupo Visabeira, S.A

Neste dia 28 de janeiro de 2023 celebra-se mais um Dia Internacional da Proteção dos Dados, permanecendo atual o principal objetivo que há 17 anos norteou a sua instituição, de fomentar a consciencialização dos utilizadores de dados pessoais sobre o imperativo da privacidade e segurança da informação, num mundo cada vez mais digital!

Sendo já notória a mudança de perceção da maioria das organizações acerca dos temas da privacidade e proteção dos dados pessoais, onde os investimentos em recursos financeiros, tecnológicos, organizacionais e humanos passaram a ser encarados como um ativo da empresa, com um fator competitivo diferenciador em relação ao mercado, urge, contudo, convergir para a construção de uma Cultura de Privacidade e Confiança Global, com a adoção e uniformização de políticas, procedimentos e práticas responsáveis e transparentes face ao crescente acesso e utilização de dados pessoais, nem sempre para fins legítimos!


Mateus Carvalho

Lecturer in Comparative and European Public Law, Universidade de Maastricht

A proteção dos nossos dados pessoais não é uma mera questão técnica. Não se reduz a listas de cookies que precisamos de aceitar ou rejeitar para ter acesso a websites. Nem se reduz a jargão informático que custa a compreender e que é preferível deixar para os entendidos. Nem tão pouco se reduz à expressão já tantas vezes repetida que anuncia os dados pessoais como ‘o novo petróleo’. A proteção dos nossos dados pessoais, creio, é uma das questões mais importantes do nosso tempo e tem uma influência decisiva na forma como concebemos a vida em democracia. Quer empresas privadas quer autoridades públicas têm um acesso sem precedentes aos nossos dados. Com eles é possível ganhar uma imagem claríssima sobre quem somos, o que gostamos, … E com esse conhecimento nasce o potencial de exploração dessa informação para distorcer a nossa perceção da realidade, ou classificar-nos de formas socialmente nefastas.

Muito já foi feito. O Regulamento Geral de Proteção de Dados da UE, e outros diplomas legais semelhantes noutras jurisdições. A proibição de certas formas de recolha e utilização de dados sensíveis. Jurisprudência que faz ascender a proteção dos nossos dados ao estatuto de direito fundamental. Mas ainda muito mais há por fazer, e o rápido desenvolvimento tecnológico só exacerba essa necessidade de o Direito se reinventar e encontrar novas formas de regular utilizações potencialmente abusivas dos nossos dados pessoais. A emergência de inteligência artificial, de novas técnicas de vigilância e investigação criminal, ou a regulação de utilização de dados recolhidos em redes sociais para campanhas eleitorais são, no meu entender, os maiores desafios correntes no campo da regulação da nossa privacidade e na definição do que é (ou não) aceitável em termos de recolha e utilização dos nossos dados. Mas talvez o maior de todos os desafios é o de sensibilização das pessoas para a urgência da existência de limitações ao uso dos nossos dados pessoais: a democratização da ideia de que intrusões na nossa privacidade não têm nem devem ser a norma nos dias que correm. De que a promoção de instrumentos – tanto privados como público – que privilegiam a privacidade by design e que põem o ser humano e a sua dignidade em primeiro lugar é fundamental em sociedades democráticas e regimes constitucionais humanistas.


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